Justiça
25 janeiro 2024 às 17h27
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Operação Marquês: José Sócrates vai ser julgado por 22 crimes, incluindo três de corrupção

Relação de Lisboa aceitou argumentos do recurso do Ministério Público à decisão instrutória do juiz Ivo Rosa. Implicados na Operação Marquês que tinham sido ilibados também serão afetados pela reversão.

O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que José Sócrates deverá ser julgado por 22 crimes, incluindo três de corrupção, 13 de branqueamento de capitais e seis de fraude fiscal, na sequência de um recurso do Ministério Público que procurava repor a acusação inicial da Operação Marquês, revelada em 2017. A decisão das desembargadoras Madalena Caldeira, Micaela Rodrigues e Raquel Lima também reverteu a decisão instrutória do juiz Ivo Rosa quanto aos restantes implicados pelo Ministério Público, incluindo alguns que tinham ficado totalmente ilibados, como Zeinal Bava e Henrique Granadeiro.

O regresso dos crimes de corrupção ao processo da Operação Marquês, que tinham sido deixados cair pelo juiz Ivo Rosa, considerando não haver indícios credíveis de que José Sócrates fora corrompido, implica que os dois ex-responsáveis da Portugal Telecom responderão cada um por um crime de corrupção, com Granadeiro a somar mais dois crimes de branqueamento de capitais e dois de fraude fiscal, enquanto Bava irá responder por um de branqueamento de capitais e um de fraude fiscal.

A Relação de Lisboa estipula que o antigo presidente do Banco Espírito Santo, Ricardo Salgado, responderá por 11 crimes, sendo três por corrupção e oito por branqueamento de capitais, enquanto Joaquim Barroca, ex-administrador do Grupo Lena fica acusado de 15 crimes, e o amigo de José Sócrates, Carlos Santos Silva responderá por 23. 

Encarado pelos responsáveis da investigação como um "testa de ferro" do antigo primeiro-ministro e ex-secretário-geral do PS, Carlos Santos Silva vê recaírem sobre si duas acusações de corrupção ativa de titular de cargo político e duas de corrupção passiva para atos ilícitos. Mas também 14 crimes de branqueamento de capitais e seis de fraude fiscal qualificada.

Os argumentos do recurso do Ministério Público à decisão instrutória de Ivo Rosa também recupera vários indiciados na investigação ao esquema de corrupção que alegadamente envolve o antigo primeiro-ministro. O seu primo, José Paulo Pinto de Sousa, responderá por dois crimes de branqueamento de capitais, o gestor Hélder Bataglia por cinco crimes de branqueamento de capitais, tal como sucede com a ex-mulher de Santos Silva, Inês do Rosário. E com a ex-mulher do próprio Sócrates, Sofia Fava, novamente por um crime de branqueamento de capitais.

Também serão acusados no âmbito do processo da Operação Marquês Rui Mão de Ferro, que foi sócio de Carlos Santos Silva, a responder por um crime de branqueamento de capitais, e o administrador de empresas Rui Horta e Costa, sob o qual incidiam suspeitas de ter promovido o pagamento ilícito de dois milhões de euros a Armando Vara e Carlos Santos Silva quando era administrador do resort algarvio Vale de Lobo. Neste caso também regressa a acusação de um crime de corrupção e outro de branqueamento de capitais.

A informação deveria ter sido divulgada às 14:30, mas a decisão das três juízas desembargadoras foi atrasada devido a dificuldades no carregamento do ficheiro com a decisão das três desembargadoras no sistema informático Citius.

Ivo Rosa tinha arquivado 172 dos 189 crimes

O juiz Ivo Rosa decidira, em março de 2022, arquivar 172 dos 189 crimes que constavam da acusação do Ministério Público no âmbito do processo da Operação Marquês, deixando cair a acusação de corrupção, que era a mais grave que incidia sobre o antigo primeiro-ministro.

Ficaram apenas acusações de três crimes de branqueamento de capitais e de outros tantos de falsificação de documentos, pois Ivo Rosa considerou, na decisão instrutória, que não havia elementos de prova de que José Sócrates tenha sido corrompido. O juiz descreveu como "total incoerência e uma fantasia" a parte da acusação do Ministério Público que dava conta do recebimento de 12 milhões de euros entregues pelo antigo presidente do Banco Espírito Santo, Ricardo Salgado.

José Sócrates foi detido a 21 de novembro de 2014, no aeroporto de Lisboa, quando regressava de Paris, sendo posteriormente acusado de 31 crimes. Em causa estavam alegadas intervenções criminosas do ex-primeiro-ministro em benefício do Grupo Lena, nomeadamente através de um acordo de cooperação entre Portugal e Venezuela para a construção de 50 mil casas no país sul-americano, ou do Grupo Espírito Santo, alegando-se que o primeiro-ministro fez um favorecimento a este último aquando da oferta pública de aquisição lançada pela Sonae sobre a Portugal Telecom.

O antigo primeiro-ministro esteve em prisão preventiva durante nove meses, entre novembro de 2014 e setembro de 2015, no Estabelecimento Prisional de Évora, seguindo-se um curto período de prisão domiciliária.

No despacho de instrução do processo elaborado por Ivo Rosa também caíram as acusações de crimes de corrupção ativa de titular de cargo político que recaíam sobre Ricardo Salgado, entretanto condenado a seis anos de prisão pelos três crimes de abuso de confiança que decorreram da Operação Marquês. Por seu lado, o ex-ministro socialista Armando Vara, investigado na qualidade de administrador da Caixa Geral de Depósitos, foi condenado a dois anos de prisão por um crime de branqueamento de capitais em julho de 2021.

À espera de julgamento continua o empresário Carlos Santos Silva, amigo de José Sócrates, que Ivo Rosa pronunciou por três crimes de branqueamento de capitais e outros tantos de falsificação de documento, tendo ficado pelo caminho acusações de corrupção ativa de titular de cargo político e corrupção passiva. E foi decidido não levar a julgamento o ex-administrador do Grupo Lena, Joaquim Barroca, o ex-presidente executivo da Portugal Telecom, Zeinal Bava, o ex-administrador da Portugal Telecom, Henrique Granadeiro, e a ex-mulher do antigo primeiro-ministro, Sofia Fava.