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Internacional
04 novembro 2024 às 00h03
Leitura: 7 min

Um país, muitos sistemas de voto. E no final fica nas mãos de Kamala

No Alaska, os eleitores ordenam os candidatos por ordem de preferência. O Maine e o Nebraska são os dois únicos estados onde o mais votado não conquista todos os votos eleitorais.

Os Estados Unidos vão decidir esta terça-feira quem será o seu próximo presidente, mas, apesar do objetivo comum, a forma como esta eleição é feita depende muito do estado onde se vive. Uma variação que começa logo pelo seguinte: para um candidato chegar à Casa Branca precisa de garantir, pelo menos, 270 dos 538 votos do Colégio Eleitoral, pois esta não é uma eleição direta. Em 48 dos 50 estados norte-americanos, bem como no distrito de Columbia (onde fica a capital, Washington), o vencedor fica com todos os votos eleitorais. 

Mas as coisas são diferentes no Maine e no Nebraska, onde o candidato com maior votação popular em cada distrito ganha um voto eleitoral em cada um deles e o candidato com maior percentagem de votos dos norte-americanos recebe outros dois votos do Colégio Eleitoral.

O Maine, a par do Alaska, tem também uma forma peculiar de votar: nestes dois estados, os eleitores ordenam os candidatos por ordem de preferência. Se nenhum candidato for a primeira escolha de mais de 50% de quem votou, o que tiver menos votos é eliminado e os votos desse candidato serão atribuídos à escolha seguinte expressa no boletim. E assim sucessivamente, até alguém conseguir a maioria dos votos populares. De notar que nestes dois estados há mais candidatos na corrida além de democratas e republicanos e que no Alaska os eleitores também irão votar uma iniciativa para tentar repelir esta forma de eleger o presidente.

Um facto comum a todos os estados é que estas presidenciais são provavelmente as mais politizadas da história dos EUA por causa do efeito Donald Trump. E isso reflete-se na legislação eleitoral de cada estado - desde 2020, de acordo com a organização apartidária Voting Rights, foram aprovadas mais de 700 peças de legislação eleitoral um pouco por todo o país, algumas com o objetivo de tornar o ato de votar mais acessível, outras nem por isso.

O Indiana, por exemplo, aprovou este ano uma lei que exige que aos oficiais eleitorais identificarem eleitores não-americanos através do Departamento de Veículos Motores, entidade que emite as cartas de condução, a fim de os retirarem dos cadernos eleitorais, mas não prevê uma salvaguarda para verificar se algum deles se naturalizou entretanto.

A Carolina do Norte, um estado decisivo, tem atualmente as regras mais rígidas no voto postal, obrigando os eleitores a incluir uma cópia da sua identificação, acompanhada da assinatura de um notário ou duas testemunhas. Na Geórgia, outro estado decisivo, leis aprovadas nos últimos quatro anos acrescentaram pedidos de identificação no voto por correio e restringiram o uso de caixas de depósito de votos (semelhantes aos marcos do correio).

Medidas como estas têm especial impacto, não por serem em estados decisivos, pois também acontece noutros, mas pelo facto de o voto antecipado, seja por correio ou não, ser cada vez mais popular entre os americanos - há quatro anos a percentagem de pessoas a votar antes de 5 de novembro subiu para mais de 70% e o número de votos pelo correio ultrapassou os registados no dia das eleições pela primeira vez. Na quinta-feira, segundo dados da NBC News, cerca de 60 milhões de pessoas já tinham votado. A votação antecipada é permitida em 47 estados, DC e outros territórios, como Porto Rico, e arrancou a 6 de setembro na Carolina do Norte.

E depois há o como e o quando são contados os votos, que pode também variar de estado para estado, influenciando os resultados de cada candidato na noite eleitoral. Mas os números finais poderão ainda demorar dias a serem divulgados, pois há estados que começam a contar os votos antecipados antes de dia 5, como o Nevada, e outros que iniciam o processo apenas no dia da eleição, como a Pensilvânia ou o Wisconsin, segundo a AP.

A Geórgia protagonizou uma das polémicas da campanha devido a um conjunto de regras impostas pela Comissão Eleitoral do estado, composta por aliados de Donald Trump, mas que acabaram por ser anuladas, em última instância, pelo Supremo estadual, dominado por conservadores. Em causa estavam condições como a obrigatoriedade de contar manualmente o número de votos expressos em cada local de votação no dia da eleição ou exigir que os funcionários eleitorais de cada condado conduzam um “inquérito razoável” sobre os resultados eleitorais antes de certificá-los.

Finalmente, no dia 6 de janeiro, Kamala Harris estará na curiosa posição de certificar os resultados de uma eleição na qual foi candidata, quer tenha vencido ou não, devido ao facto de ser vice-presidente dos EUA e, por inerência, presidente do Senado, como aconteceu em 2021 com Mike Pence, com um desfecho que entrou para a história.

Mas Kamala terá agora um papel mais cerimonial, na sequência de uma lei de 2022, precisamente para evitar situações como aquela em que Donald Trump tentou pressionar o seu vice para não certificar a vitória de Joe Biden. Desta forma, de acordo com a referida lei, o presidente do Senado, neste caso Kamala Harris, ao presidir à reunião conjunta do Congresso, “não terá nenhum poder para determinar, aceitar, rejeitar ou de outra forma julgar ou resolver disputas sobre a lista adequada de eleitores, a validade dos eleitores ou os votos dos eleitores”.

Na história recente dos EUA quatro vices certificaram uma eleição na qual eram candidatos à Casa Branca, mas apenas um declarou a sua própria vitória, George Bush (1989). Richard Nixon (1961), Hubert Humphrey (1969) e Al Gore (2001) tiveram de certificar a vitória dos seus adversários.