A partir da RD Congo
26 junho 2024 às 19h34
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Especialistas temem que nova variante de mpox “mais perigosa” possa cruzar fronteiras

Todos os países deveriam preparar-se para "esta nova variante antes que se espalhe para outros lugares, antes que seja tarde demais", disse à AFP Jean Claude Udahemuka, investigador da Universidade do Ruanda, que estuda o surto.

Uma nova variante mais mortal de mpox, que se transmite mais facilmente entre pessoas, está a matar crianças e a causar abortos espontâneos na República Democrática do Congo e pode já se ter espalhado para países vizinhos, alertaram os investigadores.

Todos os países deveriam preparar-se para "esta nova variante antes que se espalhe para outros lugares, antes que seja tarde demais", disse à AFP Jean Claude Udahemuka, investigador da Universidade do Ruanda, que estuda o surto.

Um surto global de uma nova variante de Mpox, anteriormente conhecida como varíola dos macacos, espalhou-se em 2022 por mais de 110 países, afetando principalmente homens homossexuais e bissexuais. Essa foi a variante denominada por clado II.

Porém, têm existido surtos regulares da variante clado I - que é 10 vezes mais mortal - em África desde que foi detetada pela primeira vez na República Democrática do Congo em 1970. Embora o surto global tenha sido em grande parte transmitido sexualmente, as pessoas em África normalmente contraem o clado I a partir de animais infetados, como quando comem carne de caça.

Mas "era óbvio que algo estava diferente" num surto de mpox detetado entre profissionais do sexo na remota cidade mineira congolesa de Kamituga, em setembro do ano passado, disse Udahemuka numa conferência de imprensa online. Ao contrário de surtos anteriores no país da África Central, o vírus estava a ser transmitido através de relações sexuais entre heterossexuais. Os testes revelaram que se tratava de uma variante mutada da cepa original chamada clado Ib. É “sem dúvida a cepa mais perigosa até agora”, disse Udahemuka.

Mais de 1000 casos da variante clado Ib foram notificados na província de Kivu do Sul desde então, disse Leandre Murhula Masirika, que liderou a investigação local sobre o surto.

"Há mais de 20 novos casos todas as semanas só em Kamituga – e o número está a aumentar", alertou.

“Incrivelmente preocupante”

Cinco por cento dos adultos e 10 por cento das crianças que contraem a o vírus morrem, dizem os investigadores.

O vírus causa aos pacientes "erupções horríveis em todo o corpo", ao contrário do que acontece na variante clado II, que causa lesões normalmente mais limitadas à área genital, disse Trudie Lang, investigadora de saúde global da Universidade de Oxford.

A variante clado Ib também se tem espalhado através do contacto não sexual entre pessoas - incluindo entre famílias ou crianças que brincam juntas na escola - marcando uma grande mudança em relação a surtos anteriores, disseram os investigadores. Tem havido uma “grande quantidade” de transmissão entre mães ou cuidadores e crianças, disse Lang.

Esta variante também causou numerosos abortos e os investigadores estão a estudar o seu efeito a longo prazo na fertilidade. Estas diferenças significativas em relação às variantes anteriores de mpox são “incrivelmente preocupantes”, disse Lang. E os casos extremos que aparecem no hospital são provavelmente “a ponta do iceberg”, porque muitos pacientes provavelmente apresentam sintomas menos graves, acrescentou. Permanecem muitas “incógnitas importantes” sobre a nova variante, advertiu, comparando esta fase da investigação com os primeiros dias da Covid-19.

Das 384 pessoas que morreram de todas as variantes de mpox na República Democrática do Congo este ano, mais de 60 por cento eram crianças, de acordo com a Organização Mundial de Saúde.

Receios de um surto mais amplo

Até agora, a variante clado Ib espalhou-se pelas cidades congolesas de Bukavu, Uvira e Kamanyola – e esta semana foi declarado na capital da província de Kivu do Norte, Goma, disseram os investigadores. Estas cidades estão perto das fronteiras da RD Congo com Ruanda, Burundi e Uganda.

Embora a nova variante não tenha sido oficialmente notificada fora da República Democrática do Congo, poderá já se ter espalhado para países vizinhos, disse Murhula Masirika. Algumas trabalhadoras do sexo infetadas vieram destes países, acrescentou. E Goma, nomeadamente, tem um aeroporto internacional.

“Há definitivamente a oportunidade de isto acontecer num avião”, disse Lang, apelando ao mundo para agir rapidamente para conter o surto.

Uma forma de conter o surto é vacinar as trabalhadoras do sexo locais, defendem os investigadores. Resta determinar se as vacinas existentes funcionarão para a nova variante.

Mas as vacinas contra a varíola - que são baratas, amplamente disponíveis em muitos países e podem funcionar para a varíola - não foram disponibilizadas em Kamituga, disse Udahemuka.

Os investigadores em África têm apelado à RD Congo para que tenha acesso às vacinas e aos tratamentos utilizados contra a mpox em grande parte do mundo durante o surto global.

Porque se esta variante se espalhar ainda causará mais “danos realmente grandes”, alertou Murhula Masirika. "Estamos com muito medo”, vincou.

Tópicos: mpox, RDCongo