Em 2017, Tucker Carlson questionava-se: “Vladimir Putin é assim tão mau? Não é um Saddam Hussein, não é um Adolf Hitler, não é um perigo para os EUA”. Dois anos depois, garantia: “Apesar de todos os seus defeitos, [Putin] não odeia a América tanto quanto estas pessoas [liberais americanos] odeiam a Rússia. E em 2022, já depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia, mantinha: “Porque é que tenho de odiar Putin? Putin alguma vez me chamou racista? Alguma vez ameaçou demitir-me por discordar dele? [...] A resposta é não. Putin não fez nada disso”. Com tamanho historial, não espanta pois que o Kremlin tenha vindo ontem confirmar que o ex-apresentador da FOX News entrevistou o presidente russo em Moscovo. E poucos acreditam que o conteúdo de tal conversa - que segundo a agência russa TASS e o Wall Street Journal deve ser divulgado esta quinta-feira - seja crítico em relação ao senhor de Moscovo.
Para justificar que tenha sido Carlson o escolhido para Putin dar a primeira entrevista a um jornalista ocidental desde a invasão da Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022 - na verdade, a primeira desde que falou com Hadley Gamble da CNBN em outubro de 2021 - o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov explicou que o conservador “tem um ponto de vista diferente” de outros jornalistas anglo-saxónicos, apesar de “não ser de forma nenhuma pró-russo, nem pró-ucraniano, é antes pró-americano”.
Antes ainda da confirmação do Kremlin já Tucker Carlson confirmara o seu frente-a-frente com o presidente russo. Num vídeo divulgado na rede social X, o homem que em abril do ano passado deixou a FOX na sequência de um processo por difamação no valor de 787,5 milhões de dólares anunciava “estamos aqui para entrevistar o presidente da Rússia Vladimir Putin”. E explicava: “Não estamos aqui porque gostamos de Vladimir Putin... Não vos estamos a encorajar a concordar com o que Putin possa dizer, mas apelamos a que a vejam. Porque precisam de saber o máximo possível”.
Apoiante de Donald Trump, Carlson há muito se destacou pela proximidade com outros líderes populistas ou da direita mais radical. Do húngaro Viktor Orbán - sobre o qual fez um documentário, elogiando a forma como tratou os migrantes e tendo em troca tido a oportunidade de o entrevistar longamente - ao ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que elogiou profusamente, passando pelo presidente sírio, Bashar al-Assad, que defendeu perante as denúncias de barbaridades da ONU.
Protagonista de declarações polémicas sobre assuntos tão diversos como a perda de masculinidade dos homens brancos, a teoria da grande substituição (do eleitorado americano por “imigrantes obedientes”) ou os casamentos com menores, Tucker Carlson arrisca agora ser alvo de sanções da União Europeia devido à sua entrevista a Putin. A revista Newsweek foi ouvir o ex-primeiro-ministro belga e agora eurodeputado Guy Verhofstadt, segundo o qual Carlson arrisca a proibição de viajar para a UE. “Uma vez que Putin é um criminoso de guerra [é alvo de um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional] e a UE sanciona todos os que o apoiam no seu esforço, parece lógico que o Serviço de Ação Externa examine o seu caso também”, explicou Verhofstadt.
O Serviço de Ação Externa é o braço diplomático da UE responsável pela política externa. É ele que decide sobre a imposição de sanções a indivíduos e instituições.