Premium
Cultura
03 dezembro 2024 às 00h16
Leitura: 5 min

80 anos de Variações: o cantor que rompeu “com o preconceito”

O colóquio Variações em Torno de António vai realizar-se na FCSH da Universidade de Lisboa nos dias 5 e 6 de dezembro para celebrar e homenagear o cantor português.

Hoje, dia 3 de dezembro, António Variações faria 80 anos se estivesse vivo. Para recordar e homenagear o cantor português irá realizar-se nos dias 5 e 6 dezembro o colóquio Variações em Torno de António na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade de Lisboa. Durante estes dois dias vão decorrer conversas e debates sobre o impacto do artista no contexto sociopolítico da época. A programação conta com os testemunhos de Júlio Isidro, que lançou o António Variações no seu programa televisivo na RTP, Lena d’Água, cantora da mesma editora que Variações; Fernando Heitor, ator, encenador, cliente da barbearia e amigo do cantor, Luís Filipe Sarmento, jornalista e escritor que conheceu António. 

“É uma homenagem a António Variações, cantor, ícone, figura insubstituível. Pela vida dele é possível ver a história de Portugal do século passado. Ele está em todos os patamares e a vida dele ilustra as várias facetas da história. E, por isso, no colóquio vamos refletir sobre aquela época”, diz Manuela Gonzaga, historiadora e uma das organizadoras do colóquio em conversa com o DN.

Variações e o sonho de estar em palco

A música sempre fez parte da vida de António Joaquim Rodrigues Ribeiro, mais conhecido como António Variações. O seu pai tocava cavaquinho, o que o encaminhou desde cedo para o mundo da música. “Consegui recuperar testemunhos que afirmam que António, aos 5 anos de idade, ouvia músicas na rádio e depois punha-se a cantar em plenos pulmões aquilo que lhe vinha à cabeça. Ouvia-se à distância, porque os vizinhos vinham ter com o pai e diziam que o ouviam cantar”, diz a historiadora.

No entanto, é com 11 anos que António chega a Lisboa para trabalhar. Na mesma altura, matricula-se também na Voz do Operário para estudar à noite. Segundo Manuela Gonzaga, a irmã do cantor teve que dar autorização para que ele pudesse estudar, devido à sua idade. Uns anos mais tarde, esteve em Angola para o serviço militar e “fez a tropa sem disparar um tiro”.

António Variações descreveu o tempo que trabalhou no escritório como “mal empregue, porque queria cantar”. “Tinha a confiança dos patrões e ficava a fazer horas extraordinárias, devido à condição acústica muito boa no corredor do escritório e ficava ali a cantar durante horas”, sublinha a historiadora.

Viveu em Inglaterra com a sua irmã, mas foi quando se mudou para Amesterdão que teve contacto com a indústria da música. “Tirou o curso de cabeleireiro, esteve em contacto com os melhores músicos do mundo inteiro e teve conhecimento de uma outra forma de viver a liberdade”, que quis trazer para Portugal. 

Foi nos anos 80 que António Variações participou no programa de televisão de Júlio Isidro, que o lançou na carreira musicial. “No outro dia disse ao Júlio [Isidro] que se o António Variações  não tivesse ido ao programa, ele não teria sido conhecido. Sem isto ele não ia conseguir deixar o legado que deixou”, menciona. 
Manuela  Gonzaga descreve António Variações como um músico que não sabia música, mas destacava-se pela sua tonalidade: “Vem para a música com uma voz e um timbre muito particular. Ao mesmo tempo era uma voz muito contemporânea”. 

Manuela Gonzaga diz ainda que o contar “rompeu com o preconceito”. “É uma coisa histórica porque os portugueses são muito preconceituosos”. 

Quarenta anos depois da sua morte,  António Variações continua a ser relevante. “Deixou-nos pouquíssima coisa mas ainda estamos a falar dele. Continua a ser referencial”, afirma a historiadora, acrescentando que “ele estava tão à frente mo tempo que continua a ser contemporâneo. Nós não falamos dele como uma pessoa datada - escapou a estas regras de mortes e do passar de moda”. Para Manuela Gonzaga, este fenómeno deve-se à sua singularidade: “Aproveitou a sua vida até o último momento. O que deixa alguma mágoa é que podiam ter sido mais uns aninhos porque tinha muito para dar”.

A entrada no colóquio é gratuita.