Diário de Notícias
20 janeiro 2024 às 00h00
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DN em luta. 159 anos na vida de Portugal

Nunca, no século e meio de vida do Diário de Notícias, tanta incerteza se colocou aos que o fazem. Damos notícia todos os dias. Não somos a notícia. Exceto agora. Há mês e meio sem salário, os jornalistas do DN decidiram formas de luta. Mas com uma certeza: enquanto pudermos manteremos vivo este jornal.

Em 159 anos de vida, cabem muitos altos e baixos. Mas há, sobretudo, em cada página dobrada, muita história para contar. Tanta, e tão rica, que se tornou Tesouro Nacional. É esse o legado construído pelo Diário de Notícias desde que foi fundado pelo jornalista Eduardo Coelho e pelo seu sócio Tomás Quintino, em 29 de dezembro de 1864. Um jornal para “interessar a todas as classes, ser acessível a todas as bolsas, e compreensível por todas as inteligências” - assim ficava registado no seu número 1. Um diário que nasceu ainda na monarquia, viu nascer a República, resistiu à ditadura e celebrou a liberdade. 

É este mesmo DN que quer construir o futuro com a mesma resistência que o trouxe até aqui, apesar das dificuldades que vive hoje, agravadas por sucessivos atos de gestão questionáveis desde o virar do século. E é esse resumo cronológico da nossa história recente que lhe deixamos nesta página, caro leitor, para melhor compreender os tempos conturbados que atravessamos. E como necessitamos, mais do que nunca, da sua ajuda para continuar a enriquecer a história deste seu Tesouro Nacional. 

A capa do DN deste sábado.

Cronologia

29 de dezembro de 1864 - É publicado o primeiro número do Diário de Notícias, que marca o início da era do jornalismo industrial em Portugal.Eduardo Coelho foi o seu primeiro diretor, até à data da sua morte, em 1889.

1919 - O Diário de Notícias foi vendido à empresa moageira Companhia Industrial de Portugal e Colónias.

1924 - Por ocasião do 60.º aniversário, o Diário de Notícias vendia 100 mil exemplares em todo o país e empregava 560 pessoas.

1928 - Já com a ditadura instalada, a Empresa do Diário de Notícias foi convertida na Empresa Nacional de Publicidade - ENP, controlada pela Companhia Industrial de Portugal e Colónias e pela Caixa Geral de Depósitos.

1940 - Foi inaugurada uma nova sede, no número 266 da Avenida da Liberdade, projetada pelo arquiteto Pardal Monteiro e decorada com painéis de Almada Negreiros. Foi a primeira obra arquitetónica projetada de raiz para um jornal em Portugal.

1975 - José Saramago, mais tarde prémio Nobel da Literatura, integra a direção do DN, como diretor-adjunto de Luís de Barros, na época conturbada após a revolução do 25 de abril de 1974. Essa direção seria afastada após os acontecimentos político-militares de 25 de Novembro de 1975 e o Diário de Notícias esteve suspenso durante um mês.

1991 - Sob o governo de Cavaco Silva, deu-se a reprivatização da EPNC, a empresa pública a que pertencia o Diário de Notícias desde a revolução de abril. O jornal foi adquirido pela Lusomundo, empresa vocacionada para a distribuição cinematográfica e liderada pelo coronel Luís Silva, que também comprou o Jornal de Notícias.

29 de dezembro de 1995 - Na data em que completou 131 anos, o Diário de Notícias estreava a sua edição online.

2000 - A Lusomundo vende o seu negócio de media, onde estavam incluídos títulos como o Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF, à PT Multimédia, empresa do universo Portugal Telecom, num negócio avaliado em 190 milhões de euros. No primeiro trimestre desse ano, a ficha técnica do Diário de Notícias englobava 114 jornalistas e 8 repórteres fotográficos e o jornal tinha uma circulação paga, segundo dados da APCT, de 70991 exemplares em média.

2005 - Após o investimento inicial, a PT Multimedia arrefeceu o seu interesse na área dos media e acabou por vender o grupo em agosto de 2005 à Controlinveste, do empresário Joaquim Oliveira, por 300 milhões de euros. Nessa altura, o Diário de Notícias tinha 126 jornalistas e 8 repórteres fotográficos na sua ficha técnica, além de outros elementos de apoio à redação. A circulação paga do jornal era em média de 35 mil exemplares.

2009 - Em janeiro, a Controlinveste anuncia o maior despedimento no setor dos media desde a década de 1980, com o despedimento de 122 trabalhadores, dos quais mais de 50 jornalistas. No DN, saem 22 jornalistas. A circulação paga do jornal era de 42 mil exemplares em média.

2014 - Em junho, um novo despedimento coletivo na Controlinveste afeta 160 trabalhadores e leva à saída de mais 24 trabalhadores do Diário de Notícias. O empresário Joaquim Oliveira reduziu a sua posição e cedeu uma parte a bancos credores (BCP e Novo Banco) - dando lugar a novos acionistas como o empresário angolano António Mosquito e Luís Montez. Daniel Proença de Carvalho assume a presidência não executiva. Em dezembro, o grupo passa a denominar-se Global Media Group. O DN tinha então já apenas 61 jornalistas na ficha técnica, tendo perdido metade da redação em cinco anos. E tinha uma circulação paga de 15 mil exemplares.

2016 - Em novembro, a redação do jornal mudou-se do histórico edifício da Avenida da Liberdade, vendido por 20 milhões de euros a um fundo, para as Torres de Lisboa.

2017 - Dá-se a entrada do empresário macaense Kevin Ho no capital social, ficando com 30%, mediante o investimento de 15 milhões de euros. Entra também José Pedro Soeiro, “empresário e gestor com participação em empresas portuguesas, angolanas e do Reino Unido”, como se refere em comunicado.

2018 - A 2 de julho, a administração da Global Meda Group decide passar o Diário de Notícias a um jornal digital, com apenas uma edição impressa semanal. A redação tinha então 50 jornalistas.

2020 - Em abril, os diretores Catarina Carvalho e Ferreira Fernandes demitem-se após um plano de cortes apresentado pela administração, no início da pandemia de covid-19. Em setembro, o empresário Marco Galinha compra 40% da Global Media, entre os quais as participações dos bancos, por quatro milhões de euros. Em outubro, é anunciado o despedimento coletivo, já decidido antes da entrada deste acionista, de 81 pessoas, dos quais 17 jornalistas. Destes, mais de metade no DN: oito. 

29 dezembro 2020 - Diário de Notícias regressa às bancas com uma edição impressa diária, mas com uma redação entretanto reduzida para 28 jornalistas, incluindo chefias e diretores. 

2023 - Em setembro do ano passado, o World Opportunity Fund (WOF) adquiriu uma participação de 51% na empresa Páginas Civilizadas, Lda. (Páginas Civilizadas), proprietária direta da Global Media, ficando com 25,628% de participação social e dos direitos de voto GMG. Marco Galinha deixou a presidência executiva, que foi assumida por José Paulo Fafe. Em dezembro, a comissão executiva anuncia a intenção de reduzir 150 a 200 trabalhadores no grupo. Não é pago o subsídio de natal. Em final de dezembro, também não é pago o salário aos trabalhadores de vários títulos, entre os quais o DN. Situação que se mantém até hoje.

A antiga sede do DN na Avenida da Liberdade, vendida já este século. Foto: Reinaldo Rodrigues / Global Imagens

COMUNICADO DOS TRABALHADORES DO DN APROVADO ESTA SEXTA-FEIRA

Reunida em plenário, no dia 19 de janeiro de 2024, a Redação do Diário de Notícias mostrou repúdio e indignação com a atitude aviltante de um acionista, World Oportunity Fund (WOF), e do seu representante e presidente da Comissão Executiva, José Paulo Fafe, que assumidamente se recusou a pagar salários por estar em litígio, não com os trabalhadores do grupo, mas sim com outro acionista e com a ERC.

Desapareceram os argumentos invocando crises de tesouraria ou constrangimentos bancários. Finalmente se percebeu uma coisa: o WOF não paga porque não quer - não porque não pode. A indignidade é do tamanho da falta de respeito sentida.

O plenário contou com a presença do advogado do Sindicato e de elementos da ACT e da Segurança Social que esclareceram os trabalhadores sobre os mecanismos à disposição para fazer face ao incumprimento da GMG, incluindo a suspensão de contrato, que já pode ser exercida pelos trabalhadores, mas, que só seria solução financeira, com o pagamento do Subsídio de Desemprego, para daqui a um mês e num cenário otimista e de celeridade.

Algo que não serve para já, segundo a Redação, os interesses dos trabalhadores.

Perante isso e como nenhuma forma de luta ao dispor dos trabalhadores garante o imediato pagamento de salários, a Redação contou com o apoio da direção e adotou um plano de luta consistente e de gravidade gradual, que permitirá fazer valer o brio dos profissionais do DN e a relevância do título.

1 - Utilizar o Diário de Notícias, versão online e papel como forma de luta.

2 - Colocar a manchete do site a negro durante 24 horas.

3 - Exigir à GMG a regularização da situação salarial até dia 31 de janeiro. E avançar com pré-aviso de greve por tempo indeterminado se tal não acontecer.

4 - A Redação manifestou ainda total solidariedade com todos os que decidirem avançar para a suspensão imediata de contrato prevista na lei em casos de incumprimento salarial, que no caso do DN se verifica desde o mês de dezembro e com a agravante do não-pagamento do Subsídio de Natal.